A evolução da técnica feminina no ballet

A evolução da técnica feminina no ballet

Olá bailarinas e bailarinos!

Como eu venho estudado bastante a história da dança, vim compartilhar mais um dos meus aprendizados do curso profissionalizante com vocês, que será a evolução da técnica feminina no ballet, citando algumas personalidades importantes do ballet clássico e mostrando como o ballet feminino chegou ao seu estágio atual (pra não ficar desigual, também falarei da técnica masculina em um próximo post).

1) Mademoiselle de La Fontaine

Até os anos 1680, dançar ballet era coisa de HOMEM, NÃO DE MULHER ! Até esta data aproximadamente as mulheres até poderiam dançar socialmente danças da corte, mas não era considerado apropriado para as mulheres dançarem no palco. Até este período, quem fazia os papéis de mulher eram os próprios homens usando máscaras (as máscaras eram usadas para interpretar papéis de ambos os sexos na verdade) e saias.

Nos anos 1680 as mulheres começaram a dançar nos palcos. Tivemos, então, a ópera “Le Triomphe de l’amour” de Lully, um compositor do reinado de Luis XIV, em 1681, em que quatro mulheres dançaram pela primeira vez no palco. Então, a líder delas, a Mademoiselle de la Fontaine, é considerada a primeira bailarina de todos os tempos.

Embora ela tenha sido impedida pelos longos trajes, e as técnicas de ballet naquela época eram limitadas, a graça e o charme de La Fontaine eram tais que ela foi chamada de a “rainha da dança”.

De la Fontaine passou a ser a bailarina líder em pelo menos 18 outras produções na Ópera de Paris entre 1681 e 1693, incluindo “Persée” , “Amadis”, “Didon” e “Le Temple de la Paix” . Depois de dançar na Opéra por cerca de uma década, ela se aposentou em um convento.

2) Marie-Thérèse Perdou de Subligny

Quando Luis XIV fundou a “Académie Royale de Musique“, que posteriormente se tornaria a Opera de Paris, e de criar o ballet profissional, em que 10 homens e 10 mulheres puderam dançar publicamente e ainda receber um salário por isso, Marie-Thérèse Perdou de Subligny foi a primeira-bailarina desta escola profissional de ballet ao lado de Jean Ballon. Foi ela quem sucedeu La Fontaine no cargo de primeira-bailarina e lá ingressou em 1688.

Mas, a época era do Estado Absolutista e de um mundo bem patriarcal, e portanto, a mulher (mesmo no ballet) ganharia menos do que os homens e teriam menos importância na dança. Elas eram meras acompanhantes do homens, que verdadeiramente brilhavam nos palcos. Tanto é que a saia da Marie-Thérèse mostrava apenas um dos pés. Isso comprova que a técnica clássica feminina era pouquíssimo valorizada no período, pois esse tipo de saia mostraria pouquíssimo qualquer passo que fosse executado e limitaria muito os movimentos.

3) Marie-Anne Cupis de Camargo

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No século XVIII, embora o ballet continuasse sendo “coisa de homem”, as mulheres começaram a ter uma influência nesta arte, como bailarinas, professoras e coreógrafas. A primeira coreógrafa foi Françoise Prévost. Uma de suas pupilas foi Marie-Anne Cupis de Camargo, mais conhecida por La Camargo.

Esta bailarina era verdadeiramente boa, mesmo em sua estréia no palco em 1726, que foi tão impressionante que Prévost imediatamente a baniu para o corpo de baile. Mas uma noite, um dos bailarinos perdeu sua oportunidade; não pôde dançar. La Camargo viu sua chance, saltou na frente do palco e dançou o solo dele. A plateia a amou e Prévost foi forçada a se aposentar logo após esse constrangimento. Prévost também se recusou a dar mais aulas para ela, então, La Camargo estudou com bailarinos homens, como Dupré and Blondy, um sobrinho de Pierre Beauchamps (quem codificou as cinco básicas posições de ballet).

Voltaire uma vez disse que La Camargo foi a primeira bailarina a dançar como um homem, o que era um elogio. O que ele queria dizer era que seu estilo era enérgico, vigoroso, com muitos saltos e com um refinado trabalho de pés, que até então só eram feitos pelos homens. La Camargo foi provavelmente a primeira bailarina a fazer os “pas battu” (passos batidos)  como os “entrechats” e os “cabrioles” ela ainda encurtou as saias alguns centímetros para mostrar as suas pernas, fazendo notar melhor a sua técnica e o movimento em si enquanto ela executava esses passos.

4) Marie Sallé

Marie Sallé foi também uma pupila de Prévost, mas era mais quieta e chamava menos atenção, embora fosse mais graciosa e mais expressiva. Sallé ficou marcada pelo escândalo da sua versão de “Pygmalion” em 1734 no Drury Lane Theatre. A história era sobre um escultor grego que se apaixona pela estátua que ele criou de uma linda mulher, a Galatea.

A fim de melhor representar as linhas simples de uma estátua grega, Sallé abandonou o volumoso vestido antigo e apareceu, em vez disso, em um simples vestido de algodão branco, sapatos sem saltos, sem máscara, sem jóias e com seus longos cabelos sobre seus ombros. Sallé contrariou tudo o que era a regra na época e se saiu muito bem!

E isso foi o mais próximo que o público de Londres chegou para ver o que hoje poderíamos chamar de uma dançarina exótica, e havia multidões se alinhando e se amotinando nas ruas tentando conseguir ingressos.

Lá pelos anos 1770, os bailarinos pararam de usar máscaras e perucas, os seus trajes tornam-se muito menos pesados e extravagantes, as saias mais curtas e soltas, e acima de tudo ficou mais parecido com o que temos de ballet hoje.

5) Jean Dauberval, Madame Theodore e o ballet “La Fille Mal Gardee

Ao longo do século XVIII, com Jean-Georges Noverre e Gasparo Angiolini, o ballet foi reinventado, pois se criou uma nova concepção: o “ballet de action“, o que poderia ser o ballet de repertório que conhecemos hoje. Ja falei sobre Noverre em um post e sobre ballet de repertório em outro. Portanto, não vou me estender tanto nestes assuntos aqui.

O mais importante é que até então, os bailarinos usavam máscaras para interpretar seus papéis e o figurino era bastante pesado, como já se disse antes.

Noverre foi um revolucionário ao contrariar tudo isso com as suas concepções do que deveria realmente ser ballet e espetáculo. Ele foi aluno de Dupré, a quem criticou chamando de “homem máquina”. Uma grande marca sua é a valorização da expressividade, e para isso retirar as mascaras e simplificar os figurinos dos bailarinos foi fundamental.

Outra máxima de Noverre era que um espetáculo de ballet deveria contar uma historia com inicio, meio e fim, com uma lógica e que não deveria conter personagens supérfluos, de modo que todos deveriam estar ligados ao fio condutor dessa história. Todo ato do ballet deveria conter também cenas dramáticas, de modo que “divertsments” (danças apenas para divertir o público) não eram bem vistos por Noverre.

Jean Dauberval, por sua vez, foi aluno de Noverre e pegou seus ensinamentos para criar o primeiro ballet de repertório da história: “La Fille Mal Gardee”, que foi também o único ballet da Era Moderna que sobreviveu ate hoje. Neste ballet, quando da sua criação, em 1789, as bailarinas que nele dançavam não usavam a sapatilha de ponta e quem fez o papel da primeira-bailarina foi justamente a esposa de Dauberval,  Marie-Madeleine Crespé, conhecida como Madame Theodore, e foi também quem criou o seu próprio papel da Lise.

6) Genevieve Gosselin e Eudokia Istomina

Já falei também em outro post sobre a importância dessas duas bailarinas. Primeiramente, o primeiro a citar que o ballet estava se desenvolvendo tanto que se usaria pontas foi Carlo Blasis em seu “Tratado Elementar da Dança“. Blasis nao tinha definido, entretanto, se quem usaria as pontas seria a mulher, o homem ou ambos. Mas foi Didelot quem de fato colocou em prática as palavras de Blasis e foi ele quem de fato inventou a sapatilha de ponta.

Didelot foi também aluno de Noverre e muitas vezes é considerado o “pai do ballet russo” e graças a ele, duas de suas alunas usaram as pontas pela primeira vez: Genevieve Gosselin na França e Eudokia Istomina na Rússia no mesmo momento. Isso foi nos anos 1813 e 1815.

Naquele momento as pontas não eram tão elaboradas quanto hoje e as bailarinas só ficavam sob as pontas dos pés breves momentos. Mas a ideia era que a bailarina parecesse flutuar enquanto tivesse dançando sob elas.

Foi o trabalho de Didelot com essas duas alunas que abriu os caminhos da dança nas pontas que estava por vir.

7) Marie Taglioni e o ballet “La SylphideImagem relacionada

Marie Taglioni foi um grande ícone da sua época e muitas vezes é creditada por ter sido a primeira a dançar nas pontas. Já vimos que de fato, a primeira bailarina a dançar nas pontas não foi ela. Mas Marie Taglioni teve sim muita importância para a técnica feminina do ballet clássico.

Primeiramente, quando da sua estreia nos palcos como bailarina em “A recepção de uma ninfa na corte de Terpsícore“, ela não foi lá muito bem. Seu biotipo não correspondia ao das mulheres da sua época: Marie era muito magra e acreditavam que ela era muito fraca para dançar ballet.

Graças aos treinos intensos de seu pai, Philippe Taglioni, que em 1832 Marie Taglioni dançou “La Sylphide“, um ballet criado para ela por seu pai. Ela brilhou no papel! Realmente impressionou o público e este foi o papel que se tornou seu carro-chefe e que marcou a sua carreira de bailarina. Graças a ele, Marie ficou conhecida como “a bailarina cristã”, e que as pontas se tornaram o verdadeiro símbolo da leveza feminina no ballet. Mas naquele momento somente a primeira-bailarina, a estrela, usaria as pontas. E somente no papel etéreo. Tanto é que na versão do ballet de Philippe Taglioni se dança com sapatos até hoje.

Foi também o ballet que marcou o inicio da Era Romântica e que teve já uma tecnogia já para a sua época: pois a Sylphide realmente voava pendurada por cabos! Nesta fase, o ballet viveu as mesmas características que as outras artes também tiveram como um amor impossível e a valorização da mulher. Portanto, na Era Romântica, a mulher é que tinha uma importância maior do que o homem, ao contrário do que costumava ser ate então. No Romantismo, o homem passa a ser o cavalheiro acompanhante, ao passo que a mulher passa a ter os destaques, o verdadeiro centro das atenções dos ballets.

Quanto ao figurino usado, ele seria o que hoje chamamos de “tutu romântico”, que não teve grandes inovações quanto ao cumprimento desde que encurtado por La Camargo. A grande diferença é que agora ele seria mais leve e seria formado por várias camadas de tule.

8) Carlota Grisi e o ballet “Giselle”Resultado de imagem para giselle ballet 1800 carlota grisi

Carlota Grisi foi casada com Jules Perrot, que fez para ela varios ballets, inclusive seus solos de “Giselle“. Este ballet é até hoje um grande desafio de interpretação para as bailarinas que o dançam mesmo no corpo de baile. Pois seu primeiro ato é alegre, é uma grande festa. Ja o segundo, as Willis, já estão mortas, são portanto, personagens sombrios e etéreos.

Alem da mudança de interpretação, à epoca em que foi criado em 1840, continuava a mesma concepção de “La Fille“: somente os personagens etéreos usariam pontas – ou seja: só se dançava na ponta no segundo ato! O primeiro era dançado com sapatos!

Mas a grande diferença para o ballet citado anteriormente é que em Giselle todo o corpo de baile dançava sob as pontas e não mais só a estrela principal do ballet.

9) Marius Petipá

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Marius Petipá ficou mais famoso pelos ballet que coreografou do que pelos ballets que dançou. (Ele faria com que o ballet na Rússia tivesse sua “Era de Ouro” e seus ballets são bastantes conhecidos ate hoje pelo mundo inteiro – ele remontou inclusive suas próprias versões de vários ballets da Era Romântica).

Suas coreografias trouxeram grandes inovações para ballet, dentre elas, ele foi o grande precursor do que hoje conhecemos por “tutu bandeja”. Ele encurtou mais as saias da bailarina (acima dos joelhos) para que se mostrasse mais as pernas e assim se pudesse ver ainda mais a técnica clássica da mulher. Falarei mais detalhadamente sobre Petipá em posts posteriores, mas essa foi a grande mudança trazida por Petipá. Os ballets por ele criados, além de trazerem um grande virtuosismo são uma verdadeira aula de ballet clássico (seu corpo de baile de “O reino das sombras” em “La Bayadere” ficou muito conhecido por isso), pois ele prezava muito a técnica! – Ao contrário de Noverre, para quem a história seria mais importante do que o virtuosismo e a técnica clássica, não havendo espaço para “divertsments“; para Petipá a técnica e o virtuosismo seriam de vultosa importância e seus ballets teriam muitos”divertsments” (a exemplo do “pas de trois” de “O Lago dos Cines“), teriam menos importância do que o enredo do ballet.

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Tanto é que foi em um ballet de Petipá, “Cinderella“, que a bailarina italiana Pierina Legnani realizou os famosos 32 fouettes no palco em 1893. A partir disso ele criou para ela diversos outros ballets e hoje as bailarinas ficam muito mais tempo e realizam muito mais movimentos sob as pontas dos pés, além do que a estrutura da sapatilha de ponta também evoluiu em comparação ao que foi no seu início.

A técnica feminina evoluiu muito desde que o ballet começou a ser dançado por mulheres. Se antes as mulheres não tinham lá uma grande importância no ballet, hoje elas são tão importantes quanto os homens e ainda dançam nas pontas. E tudo isso pode ser explicado por cada período histórico e cada grande nome que marcou sua época no ballet.

Espero que tenham gostado do texto!

Até o próximo post!

 

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